ossonha

sábado, 6 de junho de 2009

Era um pouco estranho isso tudo. No começo achei que fosse um pouco de esclerose, no sentido de pequenos esquecimentos, como a chave do carro, o recado do telefone ou a consulta com o médico. Fui deixando essas coisas passar, não me preocupava, tentava me alimentar com mais fósforo sabe, maçã e coca-cola essas coisas que falam que auxilia, mas logo eu voltava para minha dieta normal, baseada em, o que for que tiver em casa. Minha mulher estava sempre bem vestida e um pouco chorosa, eu sabia que ela chorava, mesmo se ouvir ou ver ela fazendo-o. Estava na expressão dela.

Aos poucos fui saindo mais do quarto, da casa, conversava com algumas pessoas. Tinha um senhor muito inteligente com que eu simpatizava, conversávamos sobre Proudhon, Reclus e as vezes um pouco de Maiakovski... Acho que ele era meu sogro.

Pois é, a partir disso notei que o caso era ainda pior, não era uma esclerose, eu mal sabia onde estava ou porque estava ali. Imaginava que era minha casa, mas notei que não tenho coisas pessoais como um rádio relógio e revistas na gaveta. Na gaveta só tinha uma bíblia com um papel rasgado marcando o quarto capítulo das Gálatas onde dizia "Guardais dias, e meses, e tempos, e anos.". Eu sempre acordava neste quarto, com a mesma bíblia, mas eu não lembrava quando ou como eu ia para lá dormir.

Um passarinho pousava ao lado de fora da janela, quis ser despreocupado como eles. Eu não tenho nada meu aqui, nem tenho porque me preocupar. Decidi ler a bíblia até o doutor chegar, assim era como eu chamava o inteligente senhor... Acho que ele era meu psiquiatra!

Corri até o telefone liguei para minha esposa, ocupado, ocupado. Ocupado!

O cinza das paredes se misturava com o cinza da sombra dele passando pela porta, a bíblia ainda estava na minha mão. O recado do telefone, era sobre passarinhos, não. Era sobre as horas, isso, a hora da consulta com o médico. Eu não lembro, mais uma vez, o porquê, mas eu não queria estar lá quando ele chegasse. Saí do corredor com passos apressados e silenciosos. Não soltei a bíblia, merda de bíblia! Parei encostado em uma parede tentando escutar se alguém se aproximava, respirava ofegante me segurando para não fazer barulho, abri um pouco o livro para me distrair e o papel caiu. Ajuntei e vi que nele tinha um número. 5. Era o tempo que eu estava aqui, não sei se eram dias, meses ou anos.

O corredor me trouxe para uma saída, uma sala amarelada por um complexo de pequenos armários numerados, as portas estavam em sua maioria desbotadas e gastas pela umidade e os números apagados. O numero cinco brilhava aos meus olhos, a porta estava trancada, não foi difícil abrir à força ali dentro só havia uma coisa. Achei minha chave do carro.

Um passarinho pousava ao lado de fora da janela e logo ele voou. Minha esposa entrou no quarto com o canto dos olhos avermelhados de novo. Eu a contei como fora a ultima conversa com o pai dela, disse que alguém tinha ligado, mas não lembro quem e pedi que ela fosse ao mercado comprar umas frutas para mim porque eu não encontrava a chave do meu carro. Ela balançou a cabeça, tentou mostrar um sorriso e virou as costas. Abri a gaveta para continuar lendo, mas a bíblia não estava lá. Devo ter deixado em algum lugar, isso me incomoda as vezes, sou meio esquecido.

...

É isso aí minha gente venho tentando escrever algo assim a tempos, acho que ficou legal.

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Tudo culpa do CALcine @ 8:29 PM
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